sábado, 16 de dezembro de 2017

A Película Vai Renascer nas Redes Sociais



O fenómeno não é novo nem detém origem definida; a predominância da partilha de imagens, como em qualquer contexto digital, é uma das suas principais dinâmicas; e a sua manifestação poderá não ser mais do que um exercício de pura nostalgia. A única certeza — e os factos infra assim o procurarão testemunhar — é que a película vive, e sobrevive, nas redes sociais.

Extravasando a actividade que, primeiramente, se desenvolveu apenas em espaços cibernéticos muito específicos, onde reinavam narrativas de cabine de projecção, conhecimentos técnicos e "fetiches" em torno do celulóide, os últimos anos primaram pela transição dessas partilhas para as redes sociais. E do Facebook ao Instagram, não é árduo encontrar, em abundância, material visual sobre o tema da projecção em película.



No momento em que estas linhas são redigidas, pululam Grupos ou comunidades de Facebook de assumidos "Amigos do 70mm" e que elaboram portfolios sobre máquinas de projecção desde os primórdios da Sétima Arte, onde a presença de fotogramas em película é o principal elemento de discussão. Paralelamente, existem ainda agregadores de notícias dedicadas ao tema.

No Twitter ou no Instagram, simples pesquisas por termos como "35mm film still", "#nitratefilm" ou "70mm projection", devolvem todo o género de resultados sobre cinema analógico: bobines de filme, visitas guiadas a cabines de projecção de todo o mundo, stills e fotogramas, o fascínio pelo 70mm, arquivos cinematográficos, preservação e restauro e, inclusive, reflexões mais ou menos profundas acerca do estado actual da projecção em película.

A devoção surge, igualmente, na sua forma colectiva. São exemplos disso os perfis do Twitter do Prince Charles Cinema e do projecto AnalogueFilmScotland, ou a conta no Instagram do George Eastman Museum.



Nessa mediação, entre as plataformas digitais e a afinidade por métodos de produção e exibição cinematográficas que cada vez mais caem em desuso, reside o que poderíamos definir como paradoxo tecnológico. Isto é, são as próprias redes sociais, desenvolvidas e imbuídas por uma mentalidade de constante sonegação de tudo o que seja analógico, que incrementam e perpetuam o fascínio pela película. A ironia deste cenário constrói-se sozinha.

Esta singular expressão de cinefilia (deveremos conceber aqui o termo "celulóidefilia"?) advém, com muita probabilidade, do apreço nostálgico que a sociedade tende a nutrir por toda as manifestações de índole prática que a mudança dos tempos extingue ou torna obsoleta1.

Do mesmo modo, a irresistível tendência humana em partilhar (e esta é a palavra-chave nas redes sociais, certo?) os seus quotidianos e experiências pessoais, possibilita a sobrevivência da película, enquanto objecto, formato e especificidade tecnológica, também através destes veículos digitais.



Da mera curiosidade virtual ao acto de resistência, sem esquecer a sublimação do próprio suporte fílmico, o presente mantém todos os argumentos em prol da crença de que a película vai continuar a ser fabricada, impressa, projectada e elogiada. E, por associação, o seu ressurgimento há-de ser devidamente anunciado nas redes sociais.

Notas:
1 Por exemplo, é fácil deparar-se, nas redes sociais, com "cultos" semelhantes dedicados ao vinil, à K7 ou às máquinas de escrever mecânicas.

Imagens:
1 Paul™, Twitter.
2 Arthur Béranger‏, Twitter.
3 Cinemateca Francesa, Twitter.
4 Nitrate Picture Show, Twitter.

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