sábado, 19 de maio de 2018

Filmes Perdidos Portugueses: O QUIM E O MANECAS (1916, Ernesto de Albuquerque)



Inspirado na banda desenhada da autoria de Stuart de Carvalhais1, que conheceu particular popularidade através da sua publicação no semanário O Século Cómico, O QUIM E O MANECAS foi idealizado como o "primeiro filme cómico português".

Fruto da iniciativa do produtor Artur Emauz, que imediatamente contratou os serviços do realizador e fotógrafo Ernesto de Albuquerque, O QUIM E O MANECAS era a transposição para o grande ecrã, com actores de carne e osso, das duas personagens de uma série de banda desenhada que, à época, já gozava de imenso apreço pela sociedade portuguesa. No elenco, cuja composição integral ainda hoje suscita dúvidas entre os historiadores, figuravam Armindo Coelho e Hermínio Pereira nos principais papéis, secundados por Delfina Victor, José Clímaco, Guilhermina Paiva e o próprio Stuart Carvalhais como pai do Manecas.



Considerado como filme perdido, não sendo possível determinar sequer o paradeiro de uma sua imagem promocional, O QUIM E O MANECAS conheceu, no entanto, diversas referências na imprensa portuguesa. Aliás, o início das filmagens é anunciado, por várias publicações, em Outubro de 1916, numa série de artigos que permite vislumbrar as particularidades da sua produção. É exemplo disso o trecho abaixo publicado2, o qual detalha, de modo dinâmico, o quotidiano e labor das primeiras empresas cinematográficas de Portugal:

«Logo de manhã cedo, dois automóveis, postos gentilmente à disposição da Companhia pelo sr. Emauz, gerente da Empresa Internacional de Cinematografia, começaram no seu vai-vem; um deles, buzinando ferozmente, veio acordar-nos a um sono de três horas apenas e levar-nos, como que num voo, ao Coliseu da Rua da Palma, onde se tirava o primeiro episódio da fita.
Na rua, alguns guardas cívicos, sob as ordens do chefe Araújo e do cabo Guerra, afastavam a multidão dos curiosos, atraídos pelos cómicos e, principalmente, pelo "Quim" e "Manecas", que andavam numa roda viva, fora e dentro, dispondo as coisas, acertando a marcação do quadro a representar. (...)
A cena foi rápida e bem afinada, e o público, que enchia as imediações e as janelas dos prédios fronteiros, riu a bandeiras despregadas. O serviço da polícia cívica foi digno de elogio.
Os automóveis puseram-se em marcha para o bairro Brás Simões, onde novos episódios se iam passar. Preparada a máquina cinematográfica, procedeu-se a um prévio ensaio dos artistas numa das ruas daquele bairro. Nada faltava, ou antes, algumas coisas faltavam, mas que ali mesmo se arranjaram. Toda a gente achava graça e... emprestava o que fosse preciso.
»



O QUIM E O MANECAS estreou em Lisboa a 12 de Outubro de 1916, "acompanhado de outras fitas cómicas"3, no Cinema Colossal, e teria uma metragem aproximada de 10 a 15 minutos.

Notas:
1 Pintor, desenhador, caricaturista e autor de banda desenhada português, foi colaborador em vários títulos na década de 20, publicando trabalhos na revista Ilustração (a cuja fundação está ligado), no Diário de Lisboa, Diário de Notícias, O Século Cómico, Contemporânea, O Domingo Ilustrado e no semanário Repórter X. "Profundo conhecedor do basfond lisboeta, fixa da capital um registo que cruza com o seu, servindo-o com resultados surpreendentes no uso da mancha (...) e de texturas, na definição ou languidez da linha, nos ritmos do traço", in Stuart Carvalhais, de Emília Ferreira (2004, Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão: Roteiro da coleção).
2 e 3 in O Filme Quim e Manecas, de António Dias de Deus (1983, Cinemateca Portuguesa).

Imagens:
1 CinePT — Universidade da Beira Interior.
2 Stuart Carvalhais; TipoGráfico.
3 Ernesto de Albuquerque; Cinemateca Portuguesa.

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