sábado, 11 de novembro de 2017
Summits do Passado, Presente e Futuro
Na passada semana, a actualidade noticiosa foi absorvida pela organização, em Lisboa, da Web Summit. Sobre este fórum de tecnologia e empreendedorismo, e face ao aglomerado da cobertura mediática que acolheu nos últimos dias, pouco resta a acrescentar — sendo a única excepção, a este facto, a "análise dos resultados" de mais uma edição da summit de Paddy Cosgrave, e dos seus impactos para o futuro das sociedades ocidentais.
Num evento que reuniu start-ups, inovadores, personalidades políticas nacionais e internacionais, opinion makers e cerca de 60 mil participantes maioritariamente imbuídos de "gloriosa mentalidade" made in Silicon Valley, houve espaço para a apresentação de uma miríade de invenções de toda a natureza. Das tecnologias concebidas para a prosaica redução de custos (mensuráveis e imateriais) em ambientes empresariais, passando pela ideia da "Uberização" do espaço sideral ou pela exibição de andróides aparentemente inspirados das páginas de Philip K. Dick ou de um filme de Alex Garland, e culminando nas colecções de apps, e respectivos procedimentos, destinadas a roubar ainda mais complacência e tempo livre ao ser humano, a Web Summit 2017 fervilhou de futurismo tecnológico.
Contudo, e de toda a verborreia inovadora que brotou do Parque das Nações, não se reteve uma única frase que associe estes triunfos "tecnodigitais" à perpetuação da memória inerentemente humana, seja ela arcaica ou futura. Tudo é desenvolvido a pensar no "agora e a curto prazo".
Em sentido prático totalmente oposto, e a decorrer quase em simultâneo à Web Summit, a cidade de Varsóvia acolheu, nos passados dias 9 e 10 de Novembro, a Film Restoration Summit 2017.
Nesta série de conferências, lideradas por especialistas em restauro e preservação audiovisual de diversas nacionalidades, e em torno de um tema que, por definição, se debruça quase exclusivamente pelo passado, a tecnologia também esteve em plano de destaque. E o programa da Film Restoration Summit demonstra-o cabalmente: temas como os esforços para a digitalização de heranças audiovisuais, o papel dos arquivos fílmicos em ambientes digitais, os projectos de preservação digital em desenvolvimento, e a discussão sobre o passado e futuro da actividade de restauro cinematográfico dominaram os dois dias do certame.
Se os eventos acima destacados parecem confluir inteiramente no que a tecnologia e inovação digital dizem respeito, por que razão permanece a sensação de as suas intenções estarem em completa antinomia?
Sem pretensões de negar que aquilo que os oradores da Web Summit anunciaram esta semana vai desenhar, e transformar, o nosso quotidiano tal como o conhecemos, é para a perpetuação da memória audiovisual da Humanidade que a atenção deste espaço (admito, sou suspeito) vai pender.
Os suportes digitais mantêm contornos incertos sobre a sua fiabilidade, e o empreendedorismo tecnológico reveste-se de um posicionamento que privilegia a rescisão, a todos os níveis, do passado como matéria de estudo e orgulho. Deste modo, nunca será demais indagar as potencialidades dessa mesma tecnologia para a preservação de conteúdos (sobretudo, os do Século XX, do qual o Cinema foi a principal forma de arte e de registo histórico), e que suscitem no Homem a recordação das tentativas, erros e sucessos que definiram a nossa civilização.
Pois a Inteligência Artificial nunca fará esse trabalho por nós. Nem mesmo se, "carinhosamente", a baptizemos de Sophia.
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